29 janeiro 2012

A poesia sorridente de Kiocamba Cassua

Eis o Kiocamba nosso kamba das lides poéticas nas noites levarteanas comunicando com sorrisos nos lábios o seu ser. Adilson do Kassequel, ou melhor Kiocamba Cassua, neto da avó Marcela Kiocamba convoca-nos hoje para sorrirmos juntos, para homenagearmos o seu primeiro rebento poético, afinal é só sorrirmos para nascer poesia.
O poeta foi ao “balaio das palavras e da mistura foi retirando uma a uma com cuidado, escolhendo as mais belas, as mais simples, aquelas que são fáceis de ser percebidas” e trazer-nos ao banquete poesia sorridente, seguindo o conselho da professora Gabriela Antunes que em memória ainda nos fala.
“Outros Sorrisos nos Nossos Lábios” está arrumado em 3 narrações. Sim isto mesmo narrativas, pois o poeta oferece-nos 50 textos poéticos como um conjunto de relatos temáticos em que personagens, espaço e tempo são a caracterização do social, onde encontramos angústias contemporâneas e anseios comuns. Na I narrativa, encontraremos vários sorrisos mas que, segundo Dalai Lama, conforme citado pelo autor “se quisermos mais sorrisos na vida, devemos criar condições para que eles apareçam”. Na II narração “os sorrisos são simplesmente cânticos de tristeza e os choros as originais melodias de óbito”. Na III e última narração “sorriram os sofrimentos/como se fossem alegrias. Só há silêncio e solidão à volta do poeta. É tudo? Não caros leitores, a obra em leitura afigura-se-nos vasta em temática pelo que acertadamente Penelas Santana descobre “que o autor almeja cantar e encantar com sorrisos diversos... desde a melancólica à doce, desde a vida à morte, desde a guerra à paz, desde o passado ao presente e até ao futuro... esperança viva!”
Relativamente a forma, os versos de Kiocamba são livres pois o modernismo poético permite esquemas métricos sem esquema fixo, para permitir a livre criação ao poeta o que não deve afugentar o apreciador de sonetos, dos tercectos e quadras e ou o amigo que só vê poesia com rimas. Kiocamba diz “... cá estou escrevendo poesia sem regra/ pensando em ti”. Mas veremos certamente alguns elementos desta natureza mais adiante. Antes de mergulhar nos “sorrisos mundiais” e coloridos de Kiocamba, permitam-me convidar algumas mentes que se dedicam a reflexão e subsidiaram pensamentos sobre o sorriso.
Bergson o filosófo, escreveu: “O riso é algo que irrompe num estrondo e vai retumbando como o trovão na montanha, num eco que, no entanto, não chega ao infinito”. O sorriso, pelo contrário é silencioso como chuva mansa que cai e fertiliza a terra ou como brisa suave que acaricia e refresca o rosto. Enquanto o riso é extroversão, o sorriso desvenda delicadamente o interior de quem sorri.
O poder do sorriso é grande, e saber sorrir é algo de muito importante. Antoine de Saint-Exupéry diz: “No momento em que sorrimos para alguém, descobrimo-lo como pessoa, e a resposta do seu sorriso quer dizer que nós também somos pessoa para ele”.
Podemos acrescentar que o sorriso é um dos sinais de comunicação com um sentido universal: ele expressa alegria, felicidade, afeição, gentileza. O sorriso traduz, geralmente, um estado de alma; é um convite a entrar na intimidade de alguém, a participar do que lhe vai no íntimo. O homem, dotado de inteligência e vontade, pode sorrir quando tudo corre bem ou sorrir mesmo quando as coisas correm mal, dai que lemos na Bíblia, “mesmo no riso o coração sente dor”.
Kiocamba, como quase todo o poeta angolano tem grande estima por Agostinho Neto e na sua poesia podemos notar alguma intertextualidade com o “poeta maior”. Não é por nada que mesmo antes das dedicatórias encontramos Neto. Ocorre-me agora o poema em Sagrada Esperança “Não me peças sorrisos... nem sorrisos nem glórias” apenas “num novo catálogo” “terei para ti/ os sorrisos que me pedes”. Porquê? Porque os sorrisos são ainda “escuros” diz o sujeito poético de Kiocamba e, estão no além. “Os sorrisos encostados nos tambores... os sorrisos plantados em terras que germinam ferros/ sorrisos ingratos... sorrisos das crianças chamadas culpadas/erguendo taças de feiticeiras inocentes/ aí buscarei os sorrisos inocentes”.pg 20,21
Chocamo-nos recentemente com este fenómeno aqui na nossa Mátria angolana, crianças acusadas de feitiçaria o que levantou diversas reacções da sociedade. As acusações de feitiçaria têm sido descritas, tanto por mais velhos e líderes das igrejas bem como pelo governo e ONGs, como resultado da desestruturação familiar ocasionada pela guerra e pela crise econômica e social. A grande maioria das crianças acusadas são órfãs de um dos pais ou ambos, ou filhos de pais separados, sendo acolhidas por parentes como tios ou avós, ou vivem com padrastos ou madrastas que muito frequentemente são os responsáveis pelas acusações. Elas carregam “sorriso incerto”, o poeta que dá voz aos sem voz escreve: “Sou criança anestesiada/nunca sorri sorrisos/sorri apenas ventos espalhados à tempestade...”
Os parentes das crianças não conseguem sorrir para elas, antes maltratam-nos. Só o poeta buscará “todos os sorrisos/ para unificar com os cânticos da... alma” e “amanhã... dar-te-ei um amanhã branco e risonho” diz o poeta e devemos imita-lo.
As “Zuzu” cansadas mulheres vendendo ao sol no espaço luandense, são as outras personagens que merecem nossos sorrisos de modo a ganharem alento para a vida. Quem sou eu? perguntarão elas e, o poeta dirá que “sou o nada vestido de nada” Leia-se o poema na pg 34.
“Perguntem às letras/ qual é o sentido da história/num olhar sereno/ uma decisão bruta na interrogação/ do orvalho matinal”. pg 25
A resposta virá do poeta que escreverá “um poema grosso” “um poema/tímido ou talvez sem expressão física/ onde os gemidos e os lamentos/ os cantares e as melancolias/ as incertezas e os passos brancos/farão parte das letras...” pg 29.
Prossigamos, pois ainda há “outros sorrisos nos nossos lábios” que o poeta pretende partilhar, ou melhor, narrar.
Somos agora convidados a saudar África que se despede dos sofrimentos passados:
“... Adeus África ontem/ então em altos brados gritemos/ saudemos África com cantos alegres/ ... saudemos África com sorrisos alegres/... sorri África conglomerada/ restitui a graça/ a mãe negra que canta/ África, África florida que encanta pg 46-49.
Este é o anseio do poeta que almeja a paz e justiça pois na realidade o poeta constata “em ti... terras vejo crianças sem rosto/comendo sorrisos de um soldado qualquer” nas “terras áridas do mal” Nesta hora o poeta convida-nos a “dançar rítmos selvagens/ ao som do batuque africano/ com mulalas à volta da cintura/... vem sorrir/ sorrisos expirados”. Devemos aceitar o convite para partilhar com o poeta que já cansado de ver tanta dor e angústia e não quer mais “cantar melodias estranhas/ para alegrar os estômagos dos famintos”. Estamos acompanhando as notícias, na Nigéria, na Somália etc. Só o “Grandioso” para ajudar e a Ele juntamente com o poeta buscaremos Alegrias, explicação, certeza e perfume para perfumar nossos dias sofridos, nossos dias de ilusões sufocadas. Pg 54, 55, 57
O poeta ama as mulheres e nelas vive pensando, até na “... mulher violada/ nos becos escuros... mulher que se prostitui/ para afugentar a miséria/... mulher que anuncia Cristo Salvador/... mulher que educa/ o analfabeto na sanzala/ penso em ti, com sorrisos nos lábios... penso em ti/ mulher de ancas malandras/ que seduz até o cego” (ver pg 66). Elas, são fonte de inspiração do poeta e Março o mês a elas dedicado e, neste mês “sorrisos largos no rosto da mulher/seus olhos são capazes de chorar/ a alegria verdejante do horizonte branco” pois “assim já é Março e as “zuzus” podem desfilar na calçada, pg75.
O poeta liricamente canta para a princesa cujo “cheiro do teu corpo embrulha o perfume/ das rosas e a chuva utópica que cai sobre os teus cabelos”. A música romântica e carinhosa dedica-se ainda a mulheres cujos nomes são-nos revelados como, Amélia da Lomba, Evandra dos Santos, a Ema Bica mulher dos olhos negros a quem o poeta “queria oferecer uma caixinha de sorrisos/ azuis brancos outros sem cores/ ouvir a sinfonia brotada dos ... lábios lisos” A elas o poeta pede carinhoso “declama um poema para mim meu amor” e Amélia acede ao pedido com o “som da sua voz meiga” “sobre o Sacrosssanto dos Refúgios e em Espigas do Sahel”. As mulheres, lindas elas, fisgam-nos mesmo no “primeiro olhar” “beleza esculpida/ moldagem esculpida do alto/ um só olhar/ um só gesto/ uma só palavra/ e no fundo do pensamento surge a interrrogação/ (?) do céu ou do ventre”. pg 88
...
Como dissemos inicialmente, encontramos elementos estéticos e efeitos estilísticos na poesia do Kiocamba que serve-se da palavra como o material para construir um objecto artístico. De tal modo ele desvia-se da norma padrão nos diversos níveis, isto é, no semântico, no fónico e no sintâctico. Isto garante musicalidade aos poemas, são efeitos extraídos da relação extrutural das palavras. Efeitos de semelhança, efeitos de insistência ou atenuação que tendem para o aumento de intensidade da expressão ou atenuando-a, encontramos ainda figuras que marcam uma sugestão de oposição resultando em efeitos de dissociação. Eis alguns exemplos:
Amanhã escreverei um poema
que possibilite viver
que facilite sofrer ou talvez sucumbir
ou talvez um poema triste
que me permita sorrir... pg 28
Notamos o paradoxo, poema triste que permita sorrir. Encontramos a assonância e a anáfora: “ ... do mais ideal/ do mais belo/ do mais rídiculo/ do mais certo” pg 26, “... na vitalidade dos jovens/ na ambição severa dos tigres/ na esperança vermelha/ na riqueza dos abutres” pg 53, “...um só olhar/ um só gesto/ uma só palavra” pg88. A aliteração “...suturam o pensamento ensaiado...” pg 75.
Apóstrofe ou Invocação “oh!/ intransigente violino” pg 38, “... Oh meu Senhor” pg 54. Paralelismo ou simetria:
“mulher que se prostitui
para afugentar a miséria
mulher que trabalha o sexo
para movimentar a boca” pg 66.

Personificação “...panelas gritam no além do mar” pg87. O poema da página 60 exemplo de interrogação e ainda a metáfora de simples descodificação “Será que o ponto mais alto da beleza feminina/ é a fonte escondida dos países baixos/ revestidos de relvas pretas...” As rimas, apesar de em número reduzido, estão lá na pg 40 lemos “...vai caminhando com os sentimentais/ teus amigos ideiais...”, na pg 43 “...não há carnaval sem cores/ (?) que sorrisos largos são esses/ no rosto da mulher com dores?” Na pg 43, “... o vermelho que se esqueça/ o vermelho que padeça” Na pg 76 e sintam o rítmo “... Pensamentos celestiais conclamam amargura/ que mergulha no desastre da queimadura...”
Eis a poesia sorridente de Kiocamba e concluímos dizendo que sorrir é o atestado de excelência que a alma concede ao momento, aos encontros que a vida nos proporciona e à própria vida. Venham dái outros sorrisos poéticos meu kamba.
Boa leitura (a vossa) estimados.

Nguimba Ngola
Na Mulemba waxa Ngola aos 16 de Janeiro de 2012, 02h31am

Referências:
1. - Crianças feiticeiras: reconfigurando família, igrejas e estado no pós-guerra angolano, por Luena Nunes Pereira. Alojado em http://www.scielo.br/scielo.php, consultado dia 15 de Janeiro as 23h40.
2. Outros Sorrisos nos Nossos Lábios – Kiocamba Cassua, Lev´Arte, Novembro 2011
3. Sagrada Esperança – Agostinho Neto, UEA 10 ed.
4. No amanhcer da Curva – Kudijimbe , UEA, 2003
5. http://educacao.aaldeia.net/importancia-sorriso/, Consultao aos 15 de Janeiro de 2012, 22 horas
6. http://www.cerebromente.org.br/n15/mente/sorriso1a.html, Consultado aos 15 de Janeiro de 2012, 23h30.

23 setembro 2011

Pedaços de versos



Pedaços de versos soberbos

verbos dilatados e depilados

nos lados mais escuros e sombrios

da vegetação política na clínica

funcional do signo e nas manifestações

das nações geradoras de fome

e o nome esfuma-se na avenida

das aparências mas a carência

na cadência escura da miséria

é matéria de pouca prosa para

quem não prova as pedras amargas

dos dias amargos das horas apagadas

dos minutos magoados no Sistema de Coisas

Ousa pegar os pedaços de versos se as mãos

não aquecerão o dia e o esquema!

É tema de calores nas palavras controversas

diversas colheitas nas reações ditatoriais

e a “lei do estômago” nos caminhos sensorais

produz maquiavélicas imagens na correria do Sol

para atenuar a pobreza ancestral É magistral o plano

da perpetuação do verbo depilado

Libertem os os lábios ó “cagas na lata” para o Sol brilhar

e alegria nos versos soberbos em pedaços...



Mulemba waxa Ngola, 23-09-2011. 01h46´



junto todos os gritos que riscam o silêncio

também junto o canto do galo no momento

pinto a tela escura da noite com 1 vácuo imenso

e perscruto as palavras que não comento

para iluminar os bairros de barro onde

os carros contornam os sofrimentos e os

ferimentos colados no mesmo saco

onde junto os gritos que riscam o silêncio

o canto do galo no momento e a salada

é servida para a alegria do barro

o barro que volta ao barro princípio de tudo

e o fim de TODOS menos o verbo empedrado

na caixa infinita do espírito líricosatírico

princípio de LUZ

é a minha CRUZ

02h11´


Doi-me a cabeça

arranco-a de mim

e a coloco numa cabaça

e adiciono nela uma jarra

de palavras húmidas

retirando paciente Mente

as palavras estúpidas e

qualquer sombra que arromba

as portas nas ruas do pensamento

em tormento

que alívio!

retiro meticulosa Mente a cabeça

da cabaça e numa taça dourada

coloco as palavras exorcisadas

e na tigela de ouro junto os caminhos

eternos

devolvendo a cabeça em mim

com o cabaço no lugar com toda a honra

e dignidade



02h26´

09 julho 2011

na correria do Sol




Mergulho na escuridão da vida
Oiço o sussurro infantil
Oiço o choro da palmeira
“dar à criança tudo o que ela merece”
“dar à palmeira tudo, ela é uma criança”
É lema é tema e o esquema movimenta
As mãos calejadas na correria do Sol
“fumar um pica e deixar a vida me levar”
É canção de consolo nos cansados neurónios
E aos demónios espanta a caça
Oh pai do céu
Não aceito a invenção da pobreza ancestral
- filho meu
Antes de ser deus a pobreza andava com a ganância
Luta unta os pés e corre
Chuta adiante os sonhos o céu é um mistério
e a palmeira é a tua parte
e a criança é a coroa do sonho

19 junho 2011

E lá fora os cães (um cheirinho do livro...)



Nosso itinerário levara-nos a discoteca 2V , local famoso da Cidade no bairro Olhamar. Dançamos duas musicas sensuais. Ela balançava a mbunda ao ritmo da música e eu mantinha-me de pé com movimentos mínimos minhas mãos na cintura dela e a puxava ritmado para mim. Cada vez que roçava em mim, meu mastro dava pulos alegres dentro da jeans.

- Amor vamos embora, já não suporto ver como as mijonas aqui te comem com os olhos.




- Não ligues nenhuma para elas. Não chegam aos teus pés.




Falei mas olhando para a menina de calções curtos que me seduzia com olhares maliciosos. Vi a tatuagem dela na cintura, parecia ser a imagem de um penis que prolongava para além do calção. A curiosidade tomou conta de mim, queria ver o desenho todo para ver onde terminara o prepúcio mas a Chutada estava irritada e, arrastou-me para fora com palavras ofensivas.
De continua diversão, era o cenário do lado de fora da discoteca. Casais aos beijos, jovens perfilados a espera de hamburgueres. As garrafas vazias dançavam sorridentes no asfalto. Alguns policias mais adiante mandavam parar os meninos em fugidias motoboys. Seguimos contra minha vontade pois eu queria continuar la dentro contemplando a menina da tatuagem. O quarto da pensão no bairro burgues esperava por nós.






A Chutada estava com vontade, as birras estavam a subir-lhe à cabeça e estava ardendo entre as pernas, estava certa a dra Maria Manuela que dizia que a ingestão crônica de grandes quantidades de álcool por períodos prolongados de tempo, agride directamente as glândulas sexuais, provocando sua atrofia. O álcool pode aumentar o desejo, mas prejudica o desempenho e a mim não apetecia nada e sentia-me irritado quando ela me tocasse. Tirei a camisa branca e pendurei-a sobre a porta do roupeiro que gritava de dor, ja era sem tempo nova mobilia naquele quarto que escondia muitas imagens. Imagens de senhores mais velhos com duas meninas adolescentes a lamberem-lhe gostoso os genitais, imagens de mulheres casadas receiosas de serem apanhadas pelos maridos também promíscuos, imagens de sexo violento, aventuras sexuais de só ver em filmes pornográficos. Pensei na Sofia Ana, a minha amada que a procuro nas nuvens, a única mulher que fez pular um dia meu coração. A Chutada toda ela enérgica revira-me e puxa assanhada a calça.




- Mexa-se homem que estou pegando fogo. Ela sussurava.




Ganhei alguma energia e cedi, os afagos e outras fantasias fluiam e já me sentindo em prontidão é quando na verdade estava distante do momento, o mastro desobedeceu e caiu flacido entre as pernas da Chutada que começara com os gemidos – não tira essa merda sacana, me dá para valer – em vão, o coiso morrera. Foi então que vi os dedos dela a jogarem toda a frustração na minha cara.

24 abril 2011

Páscoa & Mágoa



Páscoa mágoa água escassa

assadura nos neurónios

espreitando um Salvador

oh dor de míngua luz no túnel fundo

até quando brilhará

no prato de barro da minha mãe?

Páscoa mágoas crucificadas no bolso da Pátria

sem tempo para os filhos

oh Mátria só os teus seios consolam neste dia

afinal Cristo ressurgiu ou não?

então alegro-me na tristeza

contemplando a riqueza dos escolhidos

ou dos oportunistas?

Haja PAZ e PERDÃO e ALEGRIA para todos...

01 abril 2011

sou mbora puta


Corpos vendidos ao preço do prazer

deambulam pelas ruas da cidade cruel

tentando sobreviver...


“uma rápida é X

um broche é Y”


Moral é palavra para museu


“não queremos saber”


seus valores não importam mais

vício ou necessidade?


HIV não é grossa maka

legal é o que há demais

jamais parar com a zunga do corpo

nem que xico dya ngoji nos arrastem


quem vai deter?

quem vai julgar?

quem vai cuidar?


“cala só a tua boca

pois eu sou mbora puta”




12.01.2006



30 março 2011

Pátriafarraecunga


Bocejo

E o hálito é nefasto misérias de fantasmas ruas lamacentas

Onde pululam mendigas almas expostas ao relento

Rebentos amarelados nas costas zungueiras de uma mulher

Seres sem um longe a vista só suor só dor no calor da vida


Pestanejo

Lágrimas de sangue no calor do dia cunga doentia e a minguar

Lágrimas de injustiçadas caminhadas no tribunal das aparências

Lágrimas doentias lamentando a corrida material e as coisas espirituais?

Povo sem pastor na correria abismal que se quedam em corruptos buracos


Festejo

A utopia anunciada numa escondida independência das mentes da pátria

Nos bolsos de uns a alegria da filosófica equação “safa-se quem puder”

Festejo alegrias conseguidas com incendiárias balas não valeu? Haja PAZ

Festejo o desabrochar de infraestruturas conseguidas com brancas mãos


Almejo

Unidas mãos negras (cheira a raça...) batendo palmas de diversidades diferenças

Culturas várias no tronco comum da irmandade Oh como é bom os cambuijis

Comerem no prato vasto e farto e cada um na videira que desenha sombras

De alegrias, festas, nas sextas de homens mitológicos biblicos? É farra oh pátria aproveita



25 de Março de 2011, 21:49



Fonte da foto: angodebates.blogspot.com/

Ressurgir


Ressurgir da letargia

ressurgir do silêncio

Eis-me aqui

Nguilolokienu

25 novembro 2010

A dimensão social da Literatura Angolana 35 anos depois da independência

A literatura para De Bonald é a expressão da sociedade e, aos olhos românticos, aproxima-se da vida. Mas do que só entretenimento, a literatura ainda tem o objectivo de sensibilizar e guiar a sociedade. Ao longo dos anos depois da independência, a literatura angolana tem sido marcada com vários discursos. Vamos aqui ater-nos aos aspectos sociais que intrinsecamente encontramos na literatura de angolana.

Em Dezembro de 1975, os escritores angolanos reunidos constituem a União dos Escritores Angolanos. Eles são chamados a permanecerem na vanguarda, face às grandes tarefas de libertação e reconstrução nacional. Foi assim com os predecessores dos novos escritores na altura que, na sua época, exprimiram os anseios das camadas sociais mais vulneráveis, que mais sofreram a exploração do então regime colonial.

Os escritores eram como “o sacerdote do povo e, do povo cantavam as angústias, a dor e alegrias”. Não sendo apenas uma necessidade estética, a literatura servia também como um meio de afirmação do Homem Angolano.
Com as suas especificidades culturais e suas tradições, Angola tinha que continuar em busca da independência cultural. Nesses primeiros anos de liberdade, a literatura ainda carregava o legado das gerações passadas.

Agostinho Neto, um ícone da literatura angolana, mais propriamente da poesia, pretendia uma literatura engajada. Por seu lado, o escritor Eugénio Ferreira, em 1979, incentiva os seus companheiros de letras e cultura, sublinhando que o fundamental “é que a obra literária ou artística responda às exigências de luta das massas populares... a matéria-prima de toda literatura e de toda arte deve ser a realidade social”.

Para Sainte-Beuve, as transformações políticas e sociais exercem influência estimulante no conteúdo da arte e na sua função actuante na sociedade. Assim foi que de 1975 a 1985, a carga ideológica do momento vivido em Angola foi muito marcante. Na poesia os nomes de Jofre Rocha com o seu “Assim se Fez Madrugada”, Manuel Rui com “11 Poemas em Novembro”, Ruy Duarte de Carvalho com “A Decisão da Idade”, ainda Jorge Macedo com o livro “Clima do Povo” entre outros poetas, reflectem os contornos da situação do momento.

O escritor Henriques Abranches mostra nessa altura o seu posicionamento com o texto “Reflexões sobre a Cultura Nacional - UEA, edições 70, 1980”. O romancista Pepetela vem com um discurso crítico-social, verdadeiras análises sociológicas, que se pode notar na obra “O Cão e os Calús”, publicada em 1985, onde a figura central é Tico, um poeta, filho de uma quitandeira que vive da especulação facilitada pelas dificuldades de abastecimento de produtos alimentares essenciais.

Nesta escrita inconformista, vale a pena citar ainda o escritor Manuel dos Santos Lima e o seu livro “As Lágrimas e o Vento” e, com certa ironia e um modo divertido Manuel Rui aborda vários aspectos do que caracterizava o quotidiano do momento com o seu livro “Quem me dera ser onda, 1982”.

Dinâmica literária juvenil e novos ventos literários

Em 1981, os jovens escritores que foram referidos por "novíssima geração" surgem na arena com um “discurso de nítido pendor militante”, de acordo com o crítico Pires Laranjeira. A Brigada Jovem de Literatura preencheu os espaços poéticos da década de 80, tendo publicado alguns números da revista Aspiração que deu alento a um novo período da literatura angolana - o da Renovação – movimento que tentava responder às expectativas dos responsáveis oficiais que, face à incapacidade de resposta no que diz respeito à literatura, em sede universitária, procuravam motivar e interessar a juventude para a "coisa" literária. Destaca-se também o grupo Literário OHANDANJI, formado em 1984, com Luís kandjimbo, Lopito Feijóo, António Panguila, Cikakata Mbalundu (Aníbal Simões), Domingos Ginginha e Joca Paixão e outros.

De 1985 aos anos 90, a literatura angolana preenche-se com a temática da desilusão e da angústia diante da situação de Angola que enfrentava problemas sociais gravíssimos.

Os anos 90 trazem novos ventos políticos, manifestações jubilosas anunciavam o fim da guerra em 1991. É o inaugurar de uma era nova para o país.

O dilema se o escritor deve tomar posição em frente aos problemas contemporâneos ou atender ao seu mundo interior, continua. Os escritores angolanos continuam a revelar aos seus leitores, o amor, as emoções e os actos de altruísmos perante o sofrimento dos outros e o apelo à mudança de consciência perante os comportamentos negativos.

Na óptica de Pires Laranjeira, um estudioso da literatura de Angola, esta “é uma literatura como a de qualquer outro país, com escritores de variados géneros e estilos; com temáticas universais como a morte, a luta pela sobrevivência, a critica do poder político, a critica social, etc. …”

Finalmente, o brasileiro Ricardo Riso, ao criticar a obra de Roderick Nehone escritor que se revelou nos anos 90 considera que a literatura angolana passou da “euforia comunista dos primeiros anos do país à grave crise que se espalhou nas décadas de 1980/90, motivada pela guerra civil”, realçando que “o fim do sangrento conflito no início deste século e a entrada desenfreada do capital estrangeiro, consequência da estabilidade política, Angola, mais precisamente Luanda, com suas peculiaridades e contradições, sempre foi um terreno fértil para os escritores”.

Presentemente, não é exagero afirmar que a literatura angolana ganhou maturidade e consistência e um contínuo espelhar da sua dimensão social.
Nota das fotos: Capa do livro de Pepetela, foto da net; Luís Kandjimbo, foto de Ricardo Riso e Nguimba Ngola, foto do Movimento Lev´Arte.

23 novembro 2010

Consulado do Vazio - Poesia de Gociante Patissa


Não se fez manhã ainda

Sou mais um
um mais apenas
entre milhares de anónimas penas

Pinto nestas linhas de poema desarmado
um marco de respeito pelas ideias
que morreram no peito
sem terem subido à boca
ou descido às mãos
ou beijado montras

Àqueles cuja imaginação e sonhos
se tornaram predilectos rivais
empresto uma certeza
com o calibre das outras e algo mais
não se fez manhã ainda
e não há obstáculo cricial
quando vai o coração aos pedais


Contemplação

Contemplei a equação da calema
um tanto brava
e ao mesmo tempo de toques ternos
afaguei as águas que no vai-e-vem
talvez química biologia - não sei
conservam o eterno frio sob azul

Li em cada movimento um verso
descontraído ajoelhado
como se a rezar o terço
mas a vida não é como mar
tem escala relógio e bumbar
o dever não quis esperar
e tive de zarpar


in Consulado do Vazio - KAT, Benguela 2008.

Gociante Patissa - Natural de Benguela é fundador da Associação Juvenil para a Solidariedade (AJS), estudante de Linguística no ISCED de Benguela.

Escreveu também:

A última Ouvinte, UEA 2010. Contos

O blog do poeta:
http://angodebates.blogspot.com/

A decomposição da humanidade e a sobrevivência de Simba Ukolo





O sol, como bola de fogo a esconder-se entre as árvores da Avenida de Portugal, despedia-se depois de ter cumprido com mais uma missão. Meus pés corriam lesto ao Instituto Camões. “O Quase Fim do Mundo”, novo romance de Pepetela, foi o motivo de cerca de três centenas de pessoas lotarem o auditório atribuído o seu nome, em homenagem ao Prémio Camões de 1997 ganho pelo mesmo escritor.

Foi um lançamento despido dos discursos de apresentação a que nos habituaram na nossa praça. Um diálogo sorridente entre Jacques dos Santos da Editora Chá de Caxinde, Fernando Telles, embaixador de Portugal em Angola, e o “monstro” da narrativa angolana, em perfeita interacção com a magnífica plateia em que desabrochavam distintas figuras da vida social angolana.

Segundo Pepetela, autor da obra, o livro deve apresentar-se por sí, pelo que escusado é apresentação extra. As primeiras páginas do seu romance, com um relato sobre Simba Ukolo, sobrevivente do fim do mundo, aguçaram o nosso desejo de leitura.

Uma longa fila (não de contratados, claro) de leitores, “afadigavam-se” para autografarem seus exemplares. Esgotaram-se os mais de 200 exemplares que a Chá de Caxinde levou ao local do evento, onde muitos leitores se viram frustrados, “lerparam”, por não terem conseguido comprar o livro que estava a ser comercializado por 2.500,00 kwanzas.

No final o brinde com um cockatail e, a correria dos repórteres a caçarem momentos memoráveis, e eu qual aprendiz a escriba sacando a pose com o guru . Felicitações ao escritor e que a caminhada literária seja longa com intuito de proporcionar ao espaço lusófono, anglofóno e todos outros possíveis, agradáveis emoções.




Nota: Texto publicado no Jornal Folha8, 23 de Fevereiro de 2008. Trago-o em retrospectiva.

21 novembro 2010

Os artistas e a independência

35 anos de independência! Estamos deveras livres do "fardo" colonial. Muitas figuras destacaram-se nesse tempo sendo protagonistas políticos. O Semanário Angolense, edição 392, destacou várias personalidades dentre as quais, artistas que não ficaram de parte no processo. Na música os nomes de Urbano de Castro, Artur Nunes, David Zé sempre ficarão na memória e, Viteix nas artes plásticas. Repesco de lá duas figuras que marcam as letras angolanas, artistas da palavra, Manuel Rui e Wanhenga Xitu.



RUI MONTEIRO

MRM é um dos autores angolanos mais traduzidos no estrangeiro. Um feroz cultor das tertúlias intelectuais, causou furor quando, defendendo as posições do Governo, derrotou Sousa Jamba, um intelectual que perfilava a periferia da UNITA, num debate televisivo transmitido depois de Setembro de 1992, em Lisboa e em Luanda, para discutir as causas do conflito pós-eleitoral. Nenhum desses factos, porém, lhe haverá de conferir um lugar incontornável na nossa história recente. MRM será definitivamente recordado pela história por, em Julho de 1976, ter conduzido a acusação contra 13 mercenários britânicos e norte-americanos, aprisionados nos meses precedentes, enquanto participavam em acções de combate no interior de Angola. O julgamento foi o primeiro em todo o Mundo em que o mercenarismo, uma das mais antigas profissões do planeta, foi levado a tribunal, dando lugar à condenação dos seus agentes e a uma drástica mudança de atitude dos Estados face ao fenómeno. A opinião pública simpatizou tanto com o processo, ao ponto de um dos seus mais influentes representantes da época, o falecido jornalista australiano Wilfred Barchet, ter escrito logo a seguir um livro em que considerava os mercenários «prostitutas de guerra». Manuel Rui é colaborador do Semanário Angolense, em que publica as suas crónicas dedicadas às suas «primas».


MENDES DE CARVALHO

Pode gabar-se de ser o único angolano que já chegou a ministro da Saúde sem ser médico. Conseguiu isso como uma espécie de reconhecimento pelo importante papel que desempenhou na luta política contra o colonialismo português, que lhe custou amargos anos de cadeia. Fez parte do «Processo dos 50», um julgamento político que se tornou histórico por marcar uma fase decisiva da mobilização dos angolanos para a luta pela independência. Mas, é também como escritor de primeira água que se tornou notável, já na pele de Wanhenga Xitu. Livros como «Manana», «Mestre Tamoda», «Bola com Feitiço», «O ministro» e «Os discursos de Mestre Tamoda» são as suas principais credenciais neste sector, tendo tido o privilégio de a sua obra ser estudada em universidades estrangeiras. Já octogenário, fez-se notar como homem que buscava equilíbrios entre partes desavindas, sobretudo no seio do seu partido ou como um excelente defensor das gentes humildes deste país, com pronunciamentos incisivos no Parlamento. Ficou também famoso por ter o único que, no grande debate «onomatopaico» havido aí há uns anos, conseguiu provar a Mena Abrantes, sem recurso a grandes oratórias, que até os homens podem relinchar…
Fonte dos textos sobre os escritores: Semanário Angolense, edição 392.

29 outubro 2010

Do Inferno ao Céu


Depois do Parandele de Belize, Alírio da Cruz é o segundo poeta natural de Cabinda que conheci. Ambos solicitaram-me para que comentasse seus textos poéticos. Devo salientar que apresentar uma obra literária é tarefa árdua pois que cada texto pessoal é fruto de condições únicas que respeitam ao seu contexto de produção. Há ainda os constrangimentos recíprocos na hora do pedido mas no final cedemos e arriscamos.

É dizer ainda que não somos especialista em matéria de teoria literária pelo que exercícios do gênero são frutos de autodidatismo e o intrínseco gosto pela arte literária. Assim sendo faremos uma breve apresentação para tentar indicar os propósitos da obra do amigo Alírio da Cruz e que desde já digo é puramente indispensável pois o livro por si deve apresentar-se.

Vamos reter o termo inferno que é usado por diferentes religiões, mitologias e filosofias, representando a morada dos mortos, ou lugar de grande sofrimento e de condenação. A origem do termo é latina: infernum, que significa "as profundezas" ou o "mundo inferior". Na visão espiritista, o inferno é um estado de consciência da pessoa que incorre em ações contrárias às estabelecidas pelas leis morais, as quais estão esculpidas na consciência de cada pessoa.

Quando maculamos nossa consciência passamos a viver em desajuste mais ou menos significativo de acordo com o grau de gravidade das nossas acções infelizes e, consequentemente surgem os desequilíbrios no campo espiritual, emocional, psicológico ou até mesmo orgânico. Eis que esta situação causa tremendos sofrimentos.

Dai, o poeta pensa em soltar gargalhadas ao inferno de modo a destroçar “o inferno da vida/ vida retida em ventos inquietando a retina”. As gargalhadas permitirão às “almas cativas no pranto vivo” a caminhar. (p.21)

Alírio da Cruz apropria-se da metáfora do inferno para cantar a “dor de ser gente” (p.23):


Indecifráveis são os segredos íntimos da alma
Consolada
Na calma da madrugada adormecida
Em quatro estrelas
Sentinelas vadias da alvorada molhada
Num rosto que fala mas não diz nada
Se cala
Sentindo o inferno da gente
Queimando o pouco ar que o faz ser gente”

O poeta com seu olhar microscópico mostra-nos alguns “produtos do inferno” (p.26):

“Enquanto vidas deambulam despercebidas/ Na calçada do dia/ o inferno vende seus produtos...” que são:

“peito exposto ou decotes mal protegidos” o que resulta em “um cálice de desejos/ temperando carne crua na churrasqueira da noite”. O fuzil que planta medo, a arrogãncia alcoolizada, “o rebento de um fecto parido” provavelmente deixado ao relento da vida, são “moedas do inferno”. (p. 39) Nessa interacção infernal, alguns actores sociais são “vendedores do inferno” e o poeta a estes avisa que “Não compramos /dores infinitas/ dissabores/ prantos.../ Não compramos os teus fingidos beijos/ os teus caprichosos desejos libidinosos anseios/ de nos encaminhar no mar de fogo...”

Quem sente hoje essa caminhada infernal? Muitos povos certamente e, aqui fica nas entrelinhas um clamor às autoridades governamentais para que se empenhem em ajudar o povo a sair do inferno da miséria, da pobreza pois Angola já está em paz e o povo, este sofrido povo, ainda tem “confiança alicerçada na tolerância zero e combate a corrupção” (p.59).

O amor é também causa de sofrimentos? Sim para o poeta que exprime maioritariamente nos seus cerca de 9 dezenas de textos um forte lirismo. O poeta chora, “chora amargamente”, tem angústias amorosas, é profundamente apaixonado e por amar demais ele sofre, que inferno!

“Paz não encontro, sofro/ não me concentro e choro.../ a quem dei meu amor/ como um grande refém/ em sua vida me retem/ e morto ou vivo, não me quer...” (p.17) e o pranto continua:

“És verdade, como um sonho para esquecer/ de querer aumentar no fogo a chama do amor/” .

Eis o fogo do inferno do amor não correspondido mas, para consolo “sempre vence o amor” (p.33) dai que o poeta brinda ternas palavras a virgem bela do Maiombe cujos os “pés desenham pureza” (p.81), essa “mulher ibinda/ formosa e linda.../ de panos e missangas.../ encanta a todos...” (p.84).

O poeta já não quer mais inferno, nem para si, nem para sua amada, nem para nenhum ser vivente, ele quer tão-somente:

“colher frutos/ verdes frutos/ colher doces.../ colher cinzas vivas/ esconder folhas mortas/ não quero/ não, inferno não.

Segue daí o desejo de o Céu atingir “no lugar certo eu quero estar...” i.é, na “casa de Deus “ (p.97)

“Arrebata-me senhor/ junto de ti/ nas nuvens onde esperas por mim/ para me envolveres com teu amor sem fim”. É a crença do poeta que é cristão num futuro feliz.

Alírio da Cruz que na outra pele é licenciado em Direito, brinda-nos assim com estas palavras artisticamente desenhadas, que em Cabinda tem comovido corações de muitos ouvintes nas diversas actividades sócio-culturais.

As “sanzalas d´alma” do poeta aspiram continua busca no labor poético. Em muitos dos poemas sentimos a “musicalidade” que é dada pelo ritmo e pelas rimas, essas repetições criativas de alguns sons no final ou no interior dos versos. Mas no presente poemário alguns textos não atingem já um conseguimento estético da poesia na forma e no conteúdo o que denota um incipiente labor da palavra. É também chamar atenção ao uso da Língua Portuguesa, pois encontramos erros ortográficos e gramaticais em alguns textos o que me parece não terem merecido uma cuidada revisão.

Força poeta de Cabinda e continua a brindar-nos com belos versos.



Nguimba Ngola

Talatona, aos 28 de Outubro de 2010.

20 outubro 2010

Grande Prémio Sonangol de Literatura, edição 2011

Sob o olhar de Corsino Fortes, o prémio:

• Contribui e incentiva o gosto e a criação estética e a produção científica nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).

• Promove a troca de experiências múltiplas e permite o desenvolvimento e o equilíbrio cultural e os interesses comuns no âmbito das artes e da literatura.

• É um importante vector para o desenvolvimento da arte, da ciência, e do intercâmbio cultural na comunidade.


O Vencedor do prémio


É o antropólo e historiador cabo-verdiano, João Lopes Filho concorrendo com o pseudónimo “Osagyeto Moisés.

A obra “Percursos & Destinos”

De acordo com o presidente do júri, o cabo-verdiano Corsino António Fortes, que fez o anúncio na sala de conferências da Sonangol, a escolha foi por unanimidade. Fortes fundamentou que o júri atribuiu o prémio pela audácia, pormenor descritivo e qualidade formal com que se retratou o percurso da insularidade, processos sociais, culturais de um determinado histórico da vida do povo cabo-verdiano.


Menções honrosas

O corpo de jurado da 11ª edição do grande prémio Sonangol de Literatura 2011 atribuiu menções honrosas às obras “Laço de Aço Lasso” de Jordão Augusto Trajano, de pseudónimo “Serafim”, de Angola, por constituir uma excelente partitura literária plasmada em sonetos.

A outra menção honrosa foi atribuída à obra “Filho do Planalto” de Marcelo Panguana, de pseudónimo “Zé Chibadura”, de nacionalidade moçambicana, pela coerência interna do seu conteúdo, pertinência, cristalização de formas, estilo e por permitir uma leitura lúdica.


              
O corpo de juri

Constituído pelo presidente, Corsino António Fortes, Cornélio Caley – Sonangol
Manuel Muanza - União dos Escritores Angolanos
Frederico Gustavo dos Anjos - São Tomé e Princípe
Francisco Conduto de Pinapela - Guiné Bissau
Carlos Paradona - Moçambique
António Fernandes da Costa - Ministério da Cultura de Angola.


Premiados em edições anteriores

2005 Obras Vencedoras:

Retalhos do Massacre de Batepá
Ficção histórica
Malé Madeçu (São Tomé)

Baban - O Ladino
Romance
Fidalgo Preto (Cabo Verde)

2003 Obras Vencedoras:

Tábua
Poesia
Adriano Botelho de Vasconcelos (Angola)

A Candidata
Romance
Vera Valentina Duarte (Cabo Verde)
Pseudónimo: Di-Ana

2001 Obra Vencedora:

A Dívida da Peixeira
Jacinto Lemos (Angolano)
Pseudónimo: Kalunga

Menção Honrosa:
Contos
Filipe Miguel

2000 Prémio Revelação:

As Asas do Sonho Ferido
Pombal João Manuel Maria
Pseudónimo: J. Tchingueia


1999 Obras Vencedoras:

Berta Ynari ou Pretérito Imperfeito da Vida
Jacques Arlindo dos Santos (Angola)
Pseudónimo: Kassala Kamukuku

Na Corda Bamba
Carlos Manuel de Melo Araújo (Cabo Verde)

Prémio Revelação
A Contagem Regressiva
José Correia Gonçalves
Pseudónimo: Zezo Baptista

1998 Obra Vencedora

O Ano do Cão
Frederico Manuel dos Santos e Silva Cardoso
Pseudónimo: Roderick Nehone

Menção Honrosa:

Catorze Poemas em Abril
Ana Maria de Fátima dos Santos Pereira
Pseudónimo: Lwey

Pausa
Cristóvão Luís Neto
Pseudónimo: Manuel Nginga

1996 Obra Vencedora

Estórias Dispersas da Vida de um Reino
Frederico Manuel dos Santos e Silva Cardoso
Pseudónimo: Roderick Nehone

Menção Honrosa:

Inkuna Minha Terra
Manuel Augusto Fragata de Morais
Pseudónimo: Roberto Vanulu

Amores Desencontrados
João Melo
Pseudónimo: Pedro Kameka

1995 Menção Honrosa:

O Rival
Ana Francisca de S. Major
Pseudónimo: Doriana

A Estrada da Secura
Luís Kandjimbo
Pseudónimo: Sá Kandingi

1994 Obra Vencedora

Caminhos dos Encantados
José Mena Abrantes

Menção Honrosa

Sinos d'Alma
Cristóvão Luís Neto
Pseudónimo: Manuel Nginga

Cacimbos
Mário Arsénio Gonçalves

Sacudidos pelo Vento
Isequíel Cristóvão Cori

O Sal dos Olhos do Mar
António Narciso Pompílio da Silva

1993 Obra Vencedora

O Homem das Sereias
João Espírito Santo
Pseudónimo: N'Lussolo

Menção Honrosa

Estrela Lundu
Ana Francisca da Silva Major
Pseudónimo: Doriana


O Grande Prémio Sonangol de Literatura foi instituído em 1987 e é entregue no dia 25 de Fevereiro, de cada ano, data de aniversário da Sonangol.


      Nas  foto: joão lopes filho - foto da net e
      Nguimba Ngola com o Jordão Trajano "Serafim"











Do punho do meu amigo Carlos Pedro, 3 anos depois...

É difícil mergulhar no mais profundo subterrâneo da poesia e, trazer à superfície a real intenção do criador enquanto o mesmo, sujeito-poético, limita-se em traduzir de uma forma recriada movido por um sentimento próprio ou emprestado à beleza do mundo (material ou imaterial) que o rodeia com todas as suas peripécias, utilizando um recurso inalcansável que se chama subjectividade, cujos os ditos phd, litero-psicopatas ou pedras vitalícias no mundo da literatura não conseguem penetrar, sem que o autor que nem sempre é o dono da criação (sabe-se lá de onde vem a inspiração, mistério dos deuses ou Deus) possa decifra-lo.

Cada poeta na psiquiatria literária é um mundo diferente do outro e, dentro dele e nele vive as suas loucuras. O mais disperso e loucuroso poeta convence o mundo, quer seja hoje ou daqui a milhares de anos, quando escreve com veracidade as realidades da sua época eternizando-o num tempo para as gerações vindouras, sem ter que temer os críticos que por vezes não conseguem criar o que criticam e, se criam não têm o livro como modelo capaz de mudar o Mundo ja que o artista, como diz o conceito netiano, é um formador de consciência, como é o caso do poema kumbú sujo que se assemelha a vida de muitos jovens desempregados ou mal empregados que não desfrutam os momentos hilariantes da vida com a mulher do sonho porque não há agulha política para remendar-lhes os bolsos rasgados.

Meu kamba das batalhas infinitas e das conversas filosóficas sabor a vinho, a medida que te escrevo e me escrevo neste dia cinzento em que os fantasmas anunciam a não entrega do prémio literário Antóno Jacinto por falta de qualidade sengundo os mesmos, há uma parte do universo literário que se afunda dentro de mim porque a história traz-me lembranças amargas de grandes poetas, artistas eternizados no tempo que na sua época mal entendidos, foram escorraçados ou até mesmo mortos aprovados somente por esta geração, por isso o poeta não precisa de perguntar ao outro poeta se o é, porque já o é mesmo sem querer ainda que os habitantes desta época não o aprovam.

O poeta é como as ervas daninhas, nascem por sí só, mesmo sem serem regadas estão sempre novas e verdes. O mais importante é estar no meio dos poetas a crescer, ler, pesquisar, debater e estabelecer um intercâmbio com a arte nas mais variadas disciplinas.

A nossa geração vencerá, aguardo-te na verdadeira união dos escritores angolanos dos nossos sonhos, lá.... no lá a frente das nossas vidas.

Carlos Pedro

Poeta e Estudante de Línguas e Literaturas Africanas.

Sede da Brigada Jovem de Literatura de Angola , aos 01 de Setembro de 2007.

07 outubro 2010

Literatura não pode ser só divertimento

O escritor peruano, Mario Vargas Llosa é o Prémio Nobel da Literatura de 2010. O escritor considera a possibilidade de a literatura "se converter nalguma coisa de marginal, relegada cada vez mais como actividade minoritária, e desenvolvida em catacumbas". Esta possibilidade encerra consequências graves para a humanidade, "haverá um grande empobrecimento da Humanidade". "E será por nossa causa, porque a literatura deve fazer parte da vida das famílias e dos programas de ensino a todos os níveis".

Qual o papel da literatura?

Num século onde o "best-seller" triunfa, deixa o escritor sem saber responder a essa pergunta. A escrita hoje é do tipo "light". Mesmo aceitando a sua função de entretenimento, avisou que a literatura não pode ser só divertimento. "Se o fosse, seria ultrapassada por outras formas mais eficazes. Não pode competir com a televisão e o cinema". "A riqueza não são as imagens. São ideias materializadas em palavras que se dizem nos livros".

O livro de literatura, é imprescindível para ensinar a falar as pessoas, defende o Nobel . "O vocabulário, os matizes, as subtilezas dão-os a boa literatura, que é aquela que mantém um alto nível de criatividade, daquilo que é diferente, do que não temos e com que sonhamos". Uma das superioridades da literatura, é a "vocação crítica, que os audiovisuais não têm ou têm domesticada".


Bibliografia


Ficção

Os Chefes (1959)
A cidade e os cachorros ("La ciudad y los perros") (1963)
A casa verde (1966) (Premio Rómulo Gallegos)
Conversa na catedral (1969)
Pantaleão e as visitadoras (1973)
Tia Júlia e o escrevinhador (1977)
A Guerra do Fim do Mundo (1981)
Historia de Mayta (1984)
Quem matou Palomino Molero? (1986)
O falador (1987)
Elogio da madrasta (1988)
Lituma nos Andes (1993). Premio Planeta
Os cadernos de Dom Rigoberto (1997)
A festa do bode (2000) - novela sobre a ditadura do general da República Dominicana, Rafael Leónidas Trujillo
O Paraíso na Outra Esquina (2003) - novela histórica sobre Paul Gauguin y Flora Tristán.
Travessuras da Menina Má (2006)


Teatro

A menina de Tacna (1981)
Kathie e o hipopótamo (1983)
La Chunga (1986)
El loco de los balcones (1993)
Olhos bonitos, quadros feios(1996)


Ensaio

García Márquez: historia de un deicidio (1971)
Historia secreta de una novela (1971)
La orgía perpetua: Flaubert y «Madame Bovary» (1975)
Contra viento y marea. Volúmen I (1962-1982) (1983)
Contra viento y marea. Volumen II (1972-1983) (1986)
La verdad de las mentiras: Ensayos sobre la novela moderna (1990)
Contra viento y marea. Volumen III (1964-1988) (1990)
Carta de batalla por Tirant lo Blanc (1991)
Desafíos a la libertad (1994)
La utopía arcaica. José María Arguedas y las ficciones del indigenismo (1996)
Cartas a un novelista (1997)
El lenguaje de la pasión (2001)
La tentación de lo imposible (2004) - ensayo


Prêmios e condecorações

Ao longo de sua carreira, Mario Vargas Llosa recebeu inúmeros prêmios e condecorações. Destacamos alguns: o Premio Rómulo Gallegos (1967) e principalmente o Prémio Cervantes (1994). Outros prêmios, a saber, o Prêmio Nacional de Novela do Peru em 1967, por seu romance A Casa Verde, o Prêmio Príncipe das Astúrias de Letras Espanha (1986) e o Prêmio da Paz de Autores da Alemanha, concedido na Feira do Livro de Frankfurt (1997). Em 1993 foi concedido o Prêmio Planeta por seu romance Lituma nos Andes. Uma grande relevância na sua carreira literária Prêmio Biblioteca Breve, que se deu por Batismo de Fogo, em 1963, marca o início de sua brilhante carreira literária internacional. É membro da Academia Peruana de Línguas desde 1977, e da Real Academia Española (RAE) desde 1994. Tem vários doutoramentos honoris causa por universidades da Europa, América e Ásia; pode-se citar os concedidos pelas universidades de Yale (1994), Universidade de Israel (1998), Harvard (1999), Universidade de Lima (2001), Oxford (2003), Universidade Europeia de Madrid (2005) e Sorbonne (2005). Foi condecorado pelo governo francês com Medalha de honra en 1985.


Nobel da Literatura

Ganhou o prémio Nobel da literatura em 2010


Referências



30 setembro 2010

Manguxi uma homenagem de jovens poetas!


Vamos declamar Poemas de NETO no Belas Shopping.
Venha partilhar o seu conhecimento sobre Agostinho Neto, escutar os seus belos Poemas e visitar a linda exposição de fotos que estará patente até ao dia 19 de Setembro.

Com as palavras acima, o Lev´Arte, movimento literário que tem realizado grandes tertúlias, convidou todos amantes da poesia de Agostinho Neto.

Este poeta, que sempre estará vivo nas nossas mentes, foi homenageado por estes dedicados jovens que fazem da poesia seu modo de vida. Não me lembro terem falhado uma semana sem brindarem seus convidados com muita poesia. Eles realizam incansáveis todas as Quintas – Feiras do mundo, eventos de poesia, a partir das 19 horas, no King’s Club, bairro Vila-Alice. O Movimento foi criado no dia 20 de Julho de 2006 e conta já com uma obra literária intitulada “Palavras”, editada pela EuroPress, uma antologia que vale a pena ler.

A viúva do poeta também esteve presente e certamente partilhou bons momentos com a juventude que aprecia Agostinho Neto.

Abaixo o poema Quitandeira, que declamei no programa Jovial Cidade da Rádio Luanda em homenagem ao poeta maior. 
 
 
 
Quitandeira



A quitanda.
Muito sol
e a quitandeira à sombra
da mulemba.

- Laranja, minha senhora,
laranjinha boa!

A luz brinca na cidade
o seu quente jogo
de claros e escuros
e a vida brinca
em corações aflitos
o jogo da cabra-cega.

A quitandeira
que vende fruta
vende-se.

- Minha senhora
laranja, laranjinha boa!

Compra laranja doces
compra-me também o amargo
desta tortura
da vida sem vida.

Compra-me a infância do espírito
este botão de rosa
que não abriu
princípio impelido ainda para um início.

Laranja, minha senhora!

Esgotaram-se os sorrisos
com que chorava
eu já não choro.

E aí vão as minhas esperanças
como foi o sangue dos meus filhos
amassado no pó das estradas
enterrado nas roças
e o meu suor
embebido nos fios de algodão
que me cobrem.

Como o esforço foi oferecido
à segurança das máquinas
à beleza das ruas asfaltadas
de prédios de vários andares
à comodidade de senhores ricos
à alegria dispersa por cidades
e eu
me fui confundindo
com os próprios problemas da existência.

Aí vão as laranjas
como eu me ofereci ao álcool
para me anestesiar
e me entreguei às religiões
para me insensibilizar
e me atordoei para viver.

Tudo tenho dado.

Até mesmo a minha dor
e a poesia dos meus seios nus
entreguei-as aos poetas.

Agora vendo-me eu própria.
- Compra laranjas
minha senhora!
Leva-me para as quitandas da Vida
o meu preço é único:
- sangue.

Talvez vendendo-me
eu me possua.

- Compra laranjas!


(Sagrada esperança)


Fotos do Lev´Arte, excepto a de ANeto retirada da Net.

O MENINO POETA


(Angola, um país de poetas. O menino poeta da foto encantou no lançamento do livro "Cartas à um Viciado do Joel e Ivandra. É pena não ter conseguido o poema. O ditado ainda é válido, "é de pequeno que se torce o pepino..." e como escreveu o escritor Luis Carlos Amorim "Que melhor maneira de iniciar nossas crianças na poesia, na literatura, do que apresentá-las à obra de grandes mestres na mais tenra idade? Sempre defendi que a criança que gosta de ler e que sabe o que ler é a criança que conviveu com livros e com literatura desde muito pequena, em sua casa, com sua família".)








O menino poeta

não sei onde está

procuro daqui

procuro de lá

tem olhos azuis

ou tem olhos negros?

Parece Jesus

ou índio guerreiro?

Ai! que esse menino

será, não será?

procuro daqui

procuro de lá.

O menino poeta

quero ver de perto.

Quero ver de perto

para me ensinar

as bonitas coisas

do céu e do mar.

(Henriqueta Lisboa)
 
 
Fonte: http://luizcarlosamorim.blogspot.com/2009/10/crianca-e-poesia.html

28 setembro 2010

Paralisia nos dedos?

Meus amados amigos!

Como puderam notar, este humilde espaço ficou muitos dias sem actualização. São vários os motivos que não me possibilitaram continuar a postar o que vai acontecendo...

Tive dificuldades de acesso à internet (não é fácil aqui...). também fiquei algo triste pois os pequenos ladrões fizeram questão de roubarem a minha máquina fotográfica com a qual ia tirando as fotos para ilustrar os meus escritos.

Aconteceram vários lançamentos de livros,  incluindo o lançamento do meu amigo José Luís Mendonça. Em breve estarei postando alguma coisa sobre o livro deste ilustre poeta. A feira da leitura e da música também foi um sucesso, as fotos estavam na máquina que chatice, e teria postado aqui a minha foto com a professora de língua e Literatura Portuguesa, Fátima Fernandes, PH.D., que acompanhou-nos ao longo da semana no Curso de Escrita Criativa na feira. Aconteceu ainda o Luanda Cartoon festival dos amigos Olímpio e Lindomar de Sousa e outras cenas culturais marcantes.

Continuem visitando que faremos tudo para não parar de partilhar o que bom ou quase isso... pois não há paralisia nos dedos.

Kandandu

Chagas de salitre (Ainda te sinto Ruy Duarte)




Olha-me este país a esboroar-se

em chagas de salitre

e os muros, negros, dos fortes

roídos pelo vegetar

da urina e do suor

a carne virgem mandada

cavar glórias e grandeza

do outro lado do mar.



Olha-me a história de um país perdido:

marés vazantes de gente amordaçada,

a ingênua tolerância aproveitada

em carne. Pergunta ao mar,

que é manso e afaga ainda

a mesma velha costa erosionada.



Olha-me as brutas construções quadradas:

embarcadouros, depósitos de gente.

Olha-me os rios renovados de cadáveres,

os rios turvos de espesso deslizar

dos braços e das mãos do meu país.



Olha-me as igrejas restauradas

sobre ruínas de propalada fé:

paredes brancas de um urgente brio

escondendo ferros de educar gentio.



Olha-me a noite herdada, nestes olhos

de um povo condenado a amassar-te o pão.

Olha-me amor, atenta podes ver

uma história de pedra a construir-se

sobre uma história morta a esboroar-se

em chagas de salitre.



(A decisão da idade)