27 setembro 2006

Tímpanos feridos




Feriram os meus tímpanos
a lira barulhenta ecoou solta no cavalo azul e branco
e gotejou notas sínfonicas venenosas
que sangraram meu silêncio

Minh’alma rasgou-se em pedaços
ofegando amassos da catinga que gargantava
derramando frustrações sedentas do bálsamo
roubado pelo kuduro malcriado

“kota se quiser cai”

E caí...
Sim caí, na poeira dos meus pés
que transportaram-me na serenidade da mente
quase demente
Caí...
do cavalo que serpenteava a esquerda e a direita
sob o olhar impávido da ganância corrupta

Divorciei-me dos decibéis destruidores
que feriram meus tímpanos e
Divorciei-me do casamento do ferro com joelhos
e livrei-me do emagrecimento compulsório
caí do azul e branco de todas as jornadas
armadas de veneno mortífero dos incivilizados



Nguimba Ngola, debaixo da Mulemba xa Ngola aos 27/09/2006

O Encantar do Lev’Arte


O Encantar do Lev’Arte
Isalino Augusto * 25/09/2006



Carríssimos leitores, eis-me aqui mais uma vez para compartilhar com vocês os momentos poéticos vividos no King’s Club. Como disse no último artigo, o King’s já virou tradição Poética toda a quinta-feira. Nesta última, dia 21 de Setembro, o tema de conversa foi a musa poética de Benguela, Alda Lara.

Dilson, o apresentador do Lev’Arte, lamentou o facto de haver muito pouca informação sobre Alda Lara, a grande Poetisa. Disse ter consultado várias fontes, incluindo na internet, mas a informação em todas elas eram escassas. No entanto a plateia bebeu com alegria a informação obtida, para uns era tudo novidade e para outros serviu de acréscimo ao que já sabiam. Aliás, é um dos objectivos do projecto, divulgar vários nomes da Poesia Angolana e além fronteira incentivando assim, a sua leitura.

Alda Ferreira Pires Barreto de Lara Albuquerque, nasceu em Benguela a 9 de Junho de 1930 e faleceu em Cambambe a 30 de Janeiro de 1962, casada com o escritor Orlando Albuquerque que propôs-se editar-lhe postumamente toda obra, resultando em um volume de poesia e um caderno de contos. Grande declamadora que alegrou grandes Poetas Africanos na casa do império, Alda brindou-nos com excelentes versos. Dilson destacou o Poema “Testamento” que pediu a participação da plateia para interpretarem os versos do testamento a prostituta mais nova do bairro mais velho e escuro. A prostituta que mereceu os brincos lavrados em cristal, límpido e puro...

E como a Poesia nos permite várias interpretações, alguns da plateia sugeriram a sua percepção do Poema, tal foi o caso do jovem Krumane que comentou que Alda, mesmo sendo abastada, preocupava-se com os desafortunados, nas contas do outro sofrer ela deixou o seu rosário para os iletrados e os poemas loucos deixou-os para seu amor Albuquerque. Outras interpretações surgiram e enriqueceram o tema.

Dilson, depois de ler o prólogo do evento, começou a chamar ao palco os Poetas da noite. O projecto tem ainda como objectivo tirar do anonimato artistas com talento para exporem os seus trabalhos, daí surgiram da plateia Poetas “curiosos”, os que pela primeira vez pisam o palco do King’s para o doce recital. Nzacran foi o primeiro com o poema de sua autoria “Sou nato de Angola”

Visto o desprezo sem luz

Nas manhãs sem verniz

Seguiram-se outros poetas gotejando seus versos que levaram ao êxtase a plateia maravilhosa que rasgou palmas de alegria, deixando ao rubro as mãos. Dentre os quais Poetas que cantaram o amor:



Gostaria de saber

A regra do amor

Está na lua nas palavras

O rosto de uma princesa sem príncipe. Krumane



Incubados fica o nosso destino

Caminhamos longe no infinito

do amor. Ludmila



A doce Jandira, ao subir ao palco, a plateia cobrou-lhe o poema “Esclareça” onde o eu Poético pede ao seu amor que se esclareça se apenas quer usa-la ou ama-la de verdade entre outros esclarecimentos devidos, a mulher amada.

Notei com muita atenção o jovem João Papelo cujas metáforas despertaram minha curiosidade, “Inconsciência”

Eu vi mistérios isolados

Nas unhas da madrugada

Noite felina de cantos tristonhos

Saudava as trevas na sua fresca expansão



Quebrou-se o momento de versos declamados para os versos cantados pela viola do Nelson Guitarra com a música “Monangamba, monangaba zé, monangabe monangaba ó”. Os Poetas da casa arrebataram as emoções da plateia. Dilson chamou ao palco o carismático Zé Isolde com o Poema “Quando cair a madrugada”. Ele disse que:



Quando cair a madrugada

Vai chover SIDA nas torneiras daquele bordel

Na Condel

Bem junto da casa do kota Fidel



O show de cores e luzes que o Patolas captou as imagens, continuou vibrante quando Kardo Bestilo, o autor do Controverso, declamou o Poema que pariu na madrugada daquele dia, “Oh Caneta Perdida!”. Nguimba Ngola levantou a plateia com o seu característico ‘boa noite’, ele com o chapéu a moda do Poeta Agostinho Neto, cantou com a plateia o seu poema “A canção pensante de Kianda” , mais vibração. Lenny matou a plateia de risos com o que ousarei chamar croni-poema que falou do peido da vizinha no elevador, ele que ia perfumado no dia do homem, sexta-feira, a uma patuscada e, como ironia, suas meias também escondiam um forte kibuzo de chulé.

Na segunda parte do programa, Zé Isolde, Kardo, Jandira, dilson e Nguimba Ngola, despejaram mais versos metaforizados para os presentes. O evento culminou com todos os poetas no palco para a habitual mistura, recitando versos no momento com um tema sugerido pela plateia “Contraste” e foi um verdadeiro contraste no palco, que o diga o Sábio.

Fui, mais volto, pois continuarei a seguir as pisadas do Lev’Arte.



www.artesaovivo.bravehost.com

Poesia








linguagem ritmada
e amada
que excita a imaginação
e provoca a sugestão
o sonho...

poesia bonita
imaginação infinita

é o que me corre na alma
e transforma meu sangue
em rimas opulentas
imperfeitas
e consonantes
e gota a gota
pintam o poema da minha existência...

“A magia das palavras”


“A magia das palavras”
Isalino Augusto debaixo da Mulemba xa Ngola, aos 20 de Setembro de 2006.



Lev’Arte, a magia das palavras. Com esta frase estampada na parte de frente das camisolas, e atrás o sinal de prioridade com a frase ‘Prioridade a Leitura’ os Poetas da casa, deram as boas vindas ao público amante da poesia.

King’s Club já virou tradição poética toda quinta-feira a noite. Na semana passada a casa encheu literalmente. Ângelo Reis na apresentação debruçou-se, na primeira parte do programa, sobre o grande enigma, Fernando Pessoa, o poeta místico. A plateia bebeu um pouco mais da seiva de Pessoa, o Alexander Search ou o Alberto Coeiro. Deixa p’ra lá o homem é mesmo místico, aliás foi membro da ordem da Rosa Cruz.

Vai abaixo o poema “Deixem-me o sono ! Sei que é já manhã”



Deixem-me o sono! Sei que é já manhã.
Mas se tão tarde o sono veio,
Quero, desperto, inda sentir a vã
Sensação do seu vago enleio.

Quero, desperto, não me recusar
A estar dormindo ainda,
E, entre a noção irreal de aqui estar,
Ver essa noção finda.

Quero que me não neguem quem não sou
Nem que, debruçado eu
Da varanda por sobre onde não estou,
Nem sequer veja o céu.





Foi o enigma em Pessoa que passou, na semana passada dia 14 de Setembro. No dia 7 de Setembro reflectiu-se sobre o que é Poesia? De facto toda quinta- feira, o Rei torna-se cada vez mais rico ali no King’s. O pessoal é arrebatado as alturas com metáforas sonantes e rios de lágrimas de alegria. Rasgam-se as mãos com palmas de satisfação.

O Lev’Arte, como o nome indica, pretende levar a arte para vários recantos recônditos desta cidade da Kianda. Em Agosto os jovens artistas deslocaram-se ao Instituto Normal de Educação Garcia Neto.



Instilaram nos jovens estudantes o desejo de escrever. Descobriu-se jovens com potencialidades poéticas com metáforas maravilhosas, lembro-me dos lábios órfãos num verso do poema do estudante Sidrake. Ângelo Reis vibrou, o Maximus Angelicum, o poeta dos pés descalços como podem notar na foto abaixo.(Aqui vê-se a foto acima)

Hoje não é quinta-feira por acaso? Epá já estava esquecido, é proibido faltar. Vou preparar minh’alma para mais logo cair na Pompílio Pompeu e desfrutar com os Kings poéticos, hoje falarão da linda Alda Lara, a musa benguelense. Está feito o convite, assista poesia todas as quintas-feiras no King’s Club. Fui, até pela semana.


Texto original em www.arteaovivo.bravehost.com

26 setembro 2006

Vitória Certa




Comí impaciente a dor da labuta
insatisfeito no jogo da procura e da oferta
automotivei-me no sonho da votória certa
na certeza do branco da paz de tanta luta

Será assim até na longevidade dos anos?
ou apenas utopia dos meus olhos
e amanhã chuva de espinhos e abrolhos
gotejando ódio e sangue violento no ânus?

Já é enciclopedia do passado aquela dor
agora deleito-me na onda do amor
na paz de espírito do saber viver

Agora sou empreendedor do amanhã
arquitecto do sonho do camboga do Unguanhã
transformando Angola no canteiro do amor.





Mulemba Xa Ngola, 12/08/2006

14 setembro 2006

No caminhar das unhas

No caminhar das unhas
encontrei o fantasma do mal
na odisseia humana de cunhas
o sonho se despedaça qual anormal

Beijo o céu noturno, violento
e no tormento dos injustiçados
chora a dor da alma cansada
na terra do safa-se quem poder

No onírico verdejante do amanhã
saboreio a ondulação marítima da paz
que me apraz
mortificando o cansaço da dor
olvidando a desgraça do desgraçado

Desperto do meu mundo utópico
vislumbro as marcas do real
e fios de lágrimas banham-me
até as vísceras
pois ainda não acabou
a odisseia dos monangamba
que andam na corda bamba
na terra do safa-se quem puder

Valha-me Deus
e livra-me dos algozes
dos montes e ilhas perenes
que estão nem aí com a dor
dos sofredores


Mulemba xa Ngola 14/09/2006 0:15'