25 agosto 2006

O Rei ficou mais Rico na Vila Alice

O Rei ficou mais Rico na Vila Alice
Isalino Augusto * 18/08/2006



O convite viajou rápido no veículo da tecnologia de informação “Assista Poesia Toda Quinta-Feira no King’s Club, O Rei ficou mais rico na Vila Alice, com Poesia ao ViVo ao som de Guitarra Nacional”.

Minha alma amante apaixonada pela poesia saltou alegre ao local do evento. 17 de Agosto de 2006, King’s Club recebia assim outros amantes da poesia. Com um ligeiro atraso dos convidados, próprio num dia de semana, ainda assim a casa não deixou de acolher o calor de rostos brilhantes que decidiram deleitar-se com palavras carregadas de mensagem lírica com imagens e ritmos de acabar com o stress e levar-nos ao sonho.

Kussi Bernardo na apresentação, levantou as almas dos convidados que adormeciam no frio do doce cacimbo com sua poderosa voz. Kiamboteeee, o microfone gritou alto cumprimentando o pessoal. Começou o evento acordando nossas faculdades mentais para a personagem tão bela como a flor rica de doces e aprazíveis versos. Florbela Espanca, alguns na plateia tinham alguma noção de quem se tratava e Kussi, despejou em resumo parte da vida e obra da musa literária portuguesa. Eis alguns aspectos da sua vida: 1894: A 8 de Dezembro, nasce Florbela Espanca em Vila Viçosa. - 1915: Casa com Alberto Moutinho. - 1919: Entra na Faculdade de Direito, em Lisboa. - 1919: Primeira obra, Livro de Mágoas. – 1923: Publica o Livro de Soror Saudade. – 1927: A 6 de Junho, morre Apeles, irmão da escritora, causando-lhe desgosto profundo. - 1930: Em Matosinhos, Florbela põe fim à vida. - 1931: Edição póstuma de Charneca em Flor, Relíquias e Juvenília e ainda das colectâneas de contos Dominó Negro e Máscara do Destino. Reedições dos dois primeiros livros editados. Verdadeiro começo da sua visibilidade generalizada.

Foram convidados voluntários da bonita plateia num número considerável que encheu a casa, para recitarem sonetos de Florbela Espanca. O António e a Manuela, deixaram de lado sua timidez e apresentaram-se ao palco. Kussi terminou a apresentação da vida e obra de Florbela Espanca com o seguinte terceto do soneto intitulado “Eu”;

Sou talvez a visão que alguém sonhou

Alguém que veio ao mundo para me ver,

E que nunca na vida me encontrou!



De seguida começou o desfile dos Poetas no palco do Rei, com fundo de tijolo verniz. Kussi, anunciou o primeiro Poeta da noite, Nguimba Ngola, que segundo o Kussi ‘o jovem que dá cabo dos nossos microfones’ recitou um soneto de sua autoria com o título “nas asas das éguas” note o segundo quarteto da poesia;



O vício cravou-lhe o ânus

Poisou em muitas águas

Cavalgando nas asas das éguas

Sangrou a raiz do prazer dos anos



Desfilaram outros Poetas maravilhosos que emprestaram o seu talento, Manuela, a linda menina com maravilhosas metáforas na sua poesia, Rodrigo, grande apaixonado da arte que vem já emprestando sua voz no espaço Bahia e, seguiram-se o Francisco, um virgem. Chamam virgem a todo Poeta que sobe pela primeira vez ao palco para o recital. Recitou também o Sábio e a linda Ludmila, com o Poema que fala dos pelos do namorado da sua amiga. Quebrou-se o clima para outro campo de arte, a guitarra do Nelson com seus dedos mágicos brindando-nos com a bonita música “umbi umbi yangue va kuele kala kassimbamba vossala possi”. A plateia vibrou, pulou e feriram as mãos com palmas alegres. Seguiu-se no desfile Ângelo Reis, eu gosto chama-lo Maximus Angelicum, o Poeta dos pés descalços que emocionou a plateia convidando-os a participarem da recitação do Poema “Sara eu te traí” abaixo alguns versos;



Quando tu esperavas por mim

Numa langerie vermelha no nosso

Esperançoso cadeirão preto

Oh! Sara eu te traí



A plateia não se conteve quando foi brindada com teatro do Grupo Teatral “Muana Mwa Zanga” com Nelson e companheiros, jovens ilhéus talentosos com uma peça sobre o casamento, este mesmo Nelson brindou ainda a plateia que se fartou de rir liberando o stress do dia, com poesia cómica. O evento no auge surgiu em palco Kardo Bestilo, o autor do livro que será muito brevemente lançado, o Controverso, recitou no seu estilo característico, correndo e pulando no palco como que num grande ‘Kibidi’ rebentando com o microfone e elevando a plateia ao delírio com o Poema que retrata o conflito entre fiscais do governo de Luanda e os zungueiros, vendedores ambulantes desta urbe, “Kibidi”;



Eles silenciaram minha razão de viver

naquele kibidi

E ainda me deixaram cego e paralizado

mas garanto que um deles

jamais vai fazer uso do mambo



Na segunda parte do evento, na revira volta ou 360º em que os Poetas voltam com um segundo Poema na noite. Nguimba Ngola foi anunciado e pulou ao palco com o Poema “Extase na solidão da noite” e Ângelo Reis declamou “Eu sou o anjo que caiu do seu para te amar”, em seguida Kussi, anunciou o Poeta que enlouquece a plateia com seus maravilhosos versos, o inspirado Zé Isolde, que chegou atrasado ao evento. Recitou o Poema que escreveu no mesmo dia em pleno candongueiro, o azul e branco de todos os dias, “Assim que morrer”;



Assim que morrer

coloquem meu corpo

no alto das cruzes do musseque

em jazigo de areia pedra e barro

o barro que não custa fortuna de

cimangolas bricomates e portland filleres

o barro é de graça



A banda que leva o nome da casa, Os The Kings, brindaram-nos com uma linda música “Hotel California”, com a plateia alegre no bater de palmas acompanhando o maravilhoso som.

Já para fechar o evento, subiram ao palco todos os Poetas da noite naquilo que ousaram chamar de projecto mistura, recital de poesia em grupo, cada um criava versos no momento, lindas metáforas e imagens coloridas com ritmo de mexer corações surgiram do que foi realmente uma liberdade total de criação.



Não me arrependi ao decidir ir para Rua Arsénio Pompílio Pompeo do Carpo, na Vila Alice, no Kings Club local bem aconchegante, desfrutando de momentos artísticos criados por jovens apaixonados pela arte. O projecto Lev’Arte, apresenta todas as quintas-feiras eventos do género e estão desejosos de expandi-lo para outros locais. Deus abençoe estes jovens que não se deixam levar pelos críticos que amarram a arte intitulando-se os donos dela. Neste ecletismo eles vão melhorando cada vez mais e amanhã, acreditem amanhã nascerão daí verdadeiros Poetas que enriquecerão nossa literatura. Eu cá já tomei minha resolução, todas as quintas-feiras os meus caminhos vão dar ao Kings Club deleitando-se com rimas e metáforas coloridas.

texto publicado no www.artesaovivo.bravehost.com

18 agosto 2006

Nas asas das éguas

A dor deitou-se na cama do vício
sequelas de longíquas boemias
sob o manto de cacimbo das gemeas
gazelas calejadas no ofício

O vício cravou-lhe o ânus
poisou em muitas águas
cavalgando nas asas das éguas
sangrou a raiz do prazer dos anos

Os ossos despiram-se da carne
sangrou tinta do pénis boemio
pseudokambas evaporaram do gremio

A carne secou de dor
madeira verniz afundou na cova nova
no inconsequente caminho do cu que leva a cova



Casa da mamoite do coqueiro, 16/08/2006

11 agosto 2006

A canção pensante da Kianda





Oh, oh, oh kianda
Oh, oh, oh kianda

A kianda sentou-se
no sofá da baía
adornada de luzes cintilantes
deleitando-se com a música
dos motores barulhentos e fumegantes

Oh, oh, oh kianda
Oh, oh, oh kianda

Kianda bebeu o suor de corredores
ávidos da boa forma
sobem e descem gotejando a gordura
dos excessos no comer e no beber

Oh, oh, oh kianda
Oh, oh, oh kianda

Kianda estasiou-se com o cheiro luandense
do frio de cacimbo no mês de agosto
com cesta básica de desgostos
e no uirom,uirom da caça aos bandidos
ou do boss que passa no cortejo da boa vida?

Oh, oh, oh kianda
Oh, oh, oh kianda

Kianda sorriu perdidamente
não de contente
pois seu doce coração
esvaziou-se de emoção
que lhe fugiu no dia a dia
nas asas de malambas

Oh, oh, oh kianda
Oh, oh, oh kianda

Kianda consolou-se no kilamba
bebeu o caldo na tigela de madeira
e a kissangua de poeira
da vida de Luanda


Deserto do Eixo-Viário 01/08/2006

04 agosto 2006

A minha poesia




A minha poesia é o grito dos injustiçados
Grito estridente pela paz e amor
Grito pela carteira e giz
Grito pelo progresso

A minha poesia é sem rima
Leva nas metáforas o som da muxima
Nos hinos, nos salmos, e nas malambas do povo
Alimentados com esperanças incertas

Promessas do outrora
Inanimadas na ganância das estrelas

Oh céu
A minha poesia chora
O pão da terra

Lamenta a sorte dos desafortunados
Machucados na alma
Tombados no sonho despedaçado

A minha poesia
Só quer pão para todos
Casa para todos, saúde para todos
Entendam bem

Para todos


Mulemba xa ngola 08/07/2006