10 agosto 2010

Gerações literárias angolanas – adjectivações precipitadas?


Com o título acima, que denota alguma polêmica, quero fazer uma breve incursão na questão das gerações literárias a que o professor e crítico literário Abreu Paxe, no caso da literatura angolana, considera terem sido adjectivadas precipitadamente.

O professor Abreu Paxe, que muito estimo e considero, aborda de memória os primórdios da nossa literatura. A fase crucial da literatura angolana, fase fundamental, foi quando se divulga a primeira obra literária, em 1849 por José da Silva Maia Ferreira, obra poética intitulada, espontaneidade da Minha Alma. Vem em seguida outros momentos que marcam a geração de 40 e 50, com o projecto “Vamos descobrir Angola”.

Geração, o que vem a ser? Socorrendo-me em Massaud Moisés , o vocábulo latino, generatio, onis ou seja , reprodução, geração, é do séc. XII mas a idéia nela contida remonta à história pré-cristã. Os latinos dividiam o século em três aetates, três gerações, assim também Herodoto nas suas histórias. O interesse consciente pelo tema geração, ressurge no séc. XIX.

Os debates em torno do tema acentuaram-se na França com Comte, Balzac, Sainte-Beuve e outros e, o mesmo se deu na Alemanhã. Já no séc. XX o debate alcançou o clímax com George Renaurd. Na alemanha destacaram-se nomes como Wilhelm Pinder, Alfred Lorenz, com alto grau de tensão. Ortega y Gasset, da Península Ibérica, também vem contribuir para o tema tal como Fidelino de Figueiredo, português e na américa do sul, Brasil, Paulo Sobrinho.

Entre as várias discussões, geração vem sendo encarada por alguns como “uma zona de 15 anos durante a qual uma certa forma de vida foi vigente. A geração seria, pois, a unidade concreta da autêntica cronologia histórica”. Para Július Petersem que descarta o conceito temporal, certo número de anos, para ele geração trata-se de um tempo interior. Ele enumera os factores que formam a geração a saber:

• Herança
• Data de nascimento
• Elementos educativos
• Comunidade pessoal
• Experiências da geração
• O guia, organizador que se coloca à cabeça dos homens da mesma idade, o mentor que atrai e assinala o caminho aos mais jovens.
• A linguagem da geração, o factor elementar.

Nota-se a idade e ideologia em afinidades para caracterizar uma geração apesar de, nem todos os seres contemporâneos formarem uma geração.

Entre nós, Luís Kandjimbo, crítico, ensaista e poeta, vem adjectivar alguns momentos da historia literária angolana. A geração do silêncio, que marca os anos 70, a geração das incertezas, que alude aos anos 80. Ainda é conhecida a geração da Mensagem (1950-53), revolução decisiva na sociedade colonial constituidos de jovens angolanos que deram o rosto e assumiram uma atitude de combate ante o sistema colonial vigente, a geração da utopia.

Mas para Abreu Paxe, é precipitada adjectivações do tipo acima “porque a literatura Angolana como realidade escrita é culturalmente marcada por dois períodos: um primeiro período em que ela é produzida sobre o manto colonial com dois segmentos, por um lado, os reprodutores dos ideiais, sonhos e utopias coloniais e, por outro, os nativistas e ou nacionalistas. Depois, um segundo período que é o do pós-independência”. A. Paxe acrescenta dizendo que não é num intervalo de dez anos que se pode fazer gerações literárias.

O que estará por detrás das adjectivações das gerações literárias angolanas tal como gerações da incertezas defendida por Luís Kandjimbo? Para Abreu Paxe o fundamental é que a literatura tem um princípio, o de ela ser regulada por método e fundamento, logo, sempre que se marca uma posição deve-se anunciar o método que se seguiu e os fundamentos que o guiam.

Para Carlos Sérgio Ferreira Cassé, escritor e jornalista, “...nunca fui muito adepto de dividir a literatura por gerações. Porque há casos de escritores que já estavam adiantados no tempo, e que a gente não pode classificar como sendo da geração do ano «x» da década «x». Eu prefiro analisar as coisas dentro da perspectiva do tempo, ou seja, o António Jacinto viveu no ano «x», morreu no ano «x» e, durante a sua vida, o tipo de literatura que António Jacinto produziu foi esta, aquela ou foi aqueloutra. E juntá-lo depois a outros escritores de outras gerações, digamos, que adoptaram a mesma corrente literária. Eu preferiria talvez ir por aí. Nunca fui muito adepto de dividir as coisas por gerações, porque há gerações que não existem em termos práticos, ou seja, que não sei que diferença há entre o princípio da minha geração e a geração de 60, por exemplo. Não há grandes diferenças em termos de forma e conteúdo. Eu não concordo muito com esta divisão geracional. Só porque eu tenho 40 anos sou assim. Às vezes, o que tem 20 tem mais ligação comigo do que outro de 40”

Ainda para Cassé, geração de incertezas deveria ser entendida como sendo “A geração que apanhou a independência com 15 anos e pouco é uma geração perdida. Não de incertezas. O problema é que as certezas desapareceram completamente. E nem sequer ficaram as incertezas, quer dizer, ficou é a certeza de um pessimismo muito grande, há uma descrença muito grande, e que é preciso ter muita coragem e muita força para manter uma certa linha de orientação que a gente traçou desde os 20 anos”.

Nas minhas leituras da história da nossa literatura, sinto-me confortado a periodiza-lo da seguinte forma:

Era

• Colonial que vai dos anos 1840 à 1975
• Pós-Independência de 1975 até hoje

Época

• 1840-1945, Origem e formação
• 1945-1959, Vamos descobrir Angola
• 1960-1979, Exaltação nacionalista
• 1980-1997, Brigadismo
• 1997- A Contínua Busca Estética e Inovações

Para mim, não será já a periodização e a consequente adjectivação das gerações a questão primordial, antes a história mais abrangente da nossa literatura pelo que, urge a sua reescrita.

Concluo fazendo minhas as palavra do crítico brasileiro Ricardo Riso “...assim é a Literatura. Ela não vive sem polêmicas” .


Referências

http://www.ricardoriso.blogspot.com/2008/04/agostinho-neto-no-foi-um-poeta-medocre.html
Moisés, Massaud Dicionário de Termos Literários, 12ª edição 2004 Cultrix, São Paulo






5 comentários:

DECIO BETTENCOURT MATEUS disse...

O Nguimba, sempre muito atento e participativo às makas literárias (e não só) cá da banda. Valeu também a pesquisa e opinião.
Uma polémica que pode ser interessante, esta levantada pelo Paxe. Seria interessane (re)ouvirmos o Kandjimbo, a propósito. Enfim, aí está lançado o convite uma boa troca de argumentos literários, muito desertos (oficialmente) entre nós.

Kandandu.

DECIO BETTENCOURT MATEUS disse...

Confesso que nunca me detive sobre esta problemática. De qualquer maneira (deve) ser normal diferenciar determinado momento marcante de qualquer literária. Havia de encontrar forma de enquadrar o Luís Kandjimbo, João Maimona, João Tala, Lopito Feijoó, Conceição Cristovão, Jose Luís Mendonça, Trajanno Nankova Trajanno, e muitos mais, quanto não fosse por razões específicas: por serem as primeiras novas manifestações literárias do pós-independência, por serem provenientes de movimentos brigadistas, por serem na altura jovens, por vivermos na altura um sistema de orientação socialista, etc. Há aqui claramente denominadores comuns que fazem deles uma espécie dentro do nosso universo literário. E depois, muito deles se afirmaram (e afirmam) literariamente.

É claro que a nossa literatura não parou por aí, felizmente. É claro que as penas emergidas depois deles têm estado – justamente – a reclamar por espaço e atenção, sobretudo por não haver quem as consagre: crítica e leitores!

Mas caberá a estas penas emergentes fazerem a sua história, ocuparem o seu espaço. É claro que para o Kandjimbo, o Maimona, Mendonça, etc. existirão eles em determinada época e os outros a posterior. Eles receberam o testemunho e deram continuidade. Outros também deverão mostrar qualidade e fôlego para fazerem parte deste processo histórico. E então depois quiça com o tempo, encarregar-se-á de enquadramentos histórico-literários mais consensuais. Mas que a diferenciação – quer em Geração de 80, Geração de Incertezas, Geração do Pós-independência e sabe-se-lá mais que nomes andem por aí – é necessária, ah, lá isso é! Os outros que reclamem o seu espaço.

Gociante Patissa disse...

É desculpar, caro cidadão, mas aqui fala o fiscal contra a mangonha. Só para te recordar que não tem o direito de "abandalhar" os leitores, com essa aparente mangonha. Quê isso de 4 semanas sem um post novo???
Um abraço!

L. Leme disse...

Olá, bom vir aqui.:)

Tchize Matias disse...

Nao querendo abusar muito das poucas palavras que foram atribuidas ao meu pequeno vocabulario...Gostaria de deixar-te tambem o meu comentario, e prezar o trabalho que tens feito na divulgacao da Literatura Angolana.. Muita Forca meu Irmao....

Aquele abraco sempre muito fraterno!